Por Renato Dias
Apesar de o presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, exorcizar o nome do educador Paulo Freire como patrono da Educação do Brasil, sob a acusação de subversão dos valores do ensino formal, de doutrinação comunista, mesmo em tempos de ‘pós-Guerra Fria’, e de vinculação com o oposto de sua versão de Escola Sem Partido, a pesquisadora Jacqueline Cunha, doutora em Eduucação, consultora da ONU para a reconstrução da Escola Pública, no Timor Leste, país da Ásia que adota a Língua Portuguesa como idioma, frisa que o pensador nunca entrou nas salas de aulas no Brasil. Apenas uma experiência pré-golpe de Estado civil e militar. De primeiro e dois de abril de 1964. De alfabetização de adultos, com seu método,diz.
– Paulo Freire passou a ser reconhecido como o patrono da educação brasileira com a Lei nº 12.612, publicada em 2012.
3º mais citado
Pesquisas, hoje, 2019, mostram que Paulo Freire é o terceiro autor mais citado no planeta na área de ciências humanas, afirma, com exclusividade. O que superaria até o velho barbudo, fundador do materialismo histórico e dialético e autor da obra seminal ‘O Capital’, Karl Marx, morto em 1883. Além do formulador da Microfísica do Poder, o frânces Michel Foucault, morto no ano de 1984. O levantamento é do Google Scholar. Trata-se de um dos pensadores da pedagogia mais relevantes do planeta, informa. A educadora frisa que a sua teoria revela sobre como o ser humano aprende e constrói conhecimento. Assim como o método adequado para aproximar o conteúdo acadêmico do universo plural e diversificado dos estudantes, atira.
– Infelizmente, as ideias de Freire e o seu método de alfabetização não entraram nas escolas brasileiras.
O fracasso da educação atual não pode ser debitado em sua conta, observa a docente. O que ocorre é o contrário, dispara. Em tom ácido, ela insiste que os males e as mazelas da educação brasileira são devidos à não aplicação das teorias de Paulo Freire nas escolas do Brasil. Em contradição, o patrono é reverenciado pelas universidades melhores classificadas nos rankings internacionais, como é o caso da universidade de Harvard, sublinha. Onde ele lecionou na década de 1960, destaca. O educador é estudado em universidades americanas, homenageado com escultura na Suécia, nome de centro de estudos na Finlândia e inspiração para cientistas em Kosovo, registra a professora do Governo de Estado e da Prefeitura Municipal de Goiânia.
Método inovador
Não custa lembrar: o método Paulo Freire de alfabetização foi aplicado no Brasil, em Angicos (RN), há exatos 55 anos. O educador, revolucionário, com um estilo inovador, além do seu tempo, instalou uma turma de camponeses. Para deflagrar um projeto de alfabetização. O curso termina com mais de 3400 pessoas alfabetizadas. O ‘Movimento de Cultura Popular’; a campanha ‘De pé no chão também se aprende a ler’ e o ‘Movimento de Educação de Base’, voltado para alfabetização de adultos, foram criados no Nordeste. Detalhe: inspirados em Paulo Freire. Com a ideia original de tornar homens e mulheres, adultos, aptos a ler, em 40 horas de trabalho.Os resultados impressionaram o presidente da República, João Belchior Marques Goulart, que na época convidou Paulo Freire para criar cerca de 20 mil círculos no País.
– Um golpe de Estado civil e militar, com a participação dos EUA, depõe João Goulart, em 1964. Paulo Freire foi taxado como ‘subversivo’, preso e exilado do Brasil.
O método de alfabetização defende que a educação deve ser significativa, ou seja, que precisa possuir um sentido para a vida do educando, fuzila. O trabalho deve se iniciar pelo levantamento das ‘palavras geradoras’, metralha. Elas são constituídas pelos vocabulários mais carregados de certa emoção, pelas palavras típicas do povo, relata. Por exemplo, uma das primeiras ‘palavras geradoras’ utilizadas era a palavra ‘vida’, observa. Em uma construção civil, a ‘palavra geradora’ era ‘tijolo’’, recorda-se. As palavras geradoras não são dadas pelo educador, mas levantadas no universo vocabular, cultural, dos educandos, escolhidas entre as mais ricas do ponto de vista semântico e sintático e expressão na visão de mundo de seus usuários.
– Paulo Freire era crítico mordaz contra a doutrinação. Ele alertava que doutrinar é o antidiálogo que “mata o poder criador não só do educando, mas também do educador”.
Ato dialógico
A educação deve ser libertadora, um ato dialógico com respeito à pluralidade de ideias, aos saberes já adquiridos, às crenças, à cultura e à realidade vivida pelos educandos, acreditava. A doutora em Educação, Jacqueline Cunha, lembra também que Paulo Freire criou os Círculos de Cultura. Como principal técnica indutora da educação dialógica, atira. Ele defendia que o diálogo é uma relação horizontal de A com B, explica. Nasce da matriz crítica e gera criticidade, narra. Nutre-se de amor, de humildade, de esperança, de fé, de confiança, registra. Apesar da revolução informacional, das mudanças da globallização, as escolas mantém-se, hoje, com as mesmas concepções arcaicas, conteudistas, fechadas dentro de seus muros, dividindo os conhecimentos da humanidade em disciplinas rígidas, em tempos estanques e distantes da vida. Paulo Freire formula críticas a essa escola tradicional bancária, como ele a apelidou,ataca
– A que aponta que quanto mais conteúdo se deposita, mais se tem. O mundo do Século 21, com informações disponíveis na palma da mão, a escola tradicional bancária, perdeu sentido
Perfil
Nome completo: Jacqueline Cunha
Formação: Doutorado em Educação e Mestrado em Ciências, pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias. Especialista em Métodos e Técnicas de Ensino; Planejamento Educacional e Educação, Desenvolvimento e Políticas Educativas. Graduada em Pedagogia pela PUC – Goiás.
Idade: 54
Cargos que ocupa: Professora da rede estadual de Goiás e da rede municipal de Goiânia. Investigadora do Centro de Estudos Interdisciplinares em Educação e Desenvolvimento – CeiEd – Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia – Portugal.
Pais: Wilna de Jesus Coelho Cunha e Euclides Leão Cunha
Irmãos: Marília Coelho Cunha, Leandro Bezerra Cunha, Leonardo Bezerra Cunha e o do coração Elvis Nogueira de Sá.
Livros lançados: Entre o sonho e a esperança: A escola ativa no Brasil e Uma escolinha triste.
Intelectuais que fazem a sua cabeça: Abílio Amiguinho, Adolf Ferrière, António Teodoro, António Nóvoa Boaventura Santos, Mia Couto, Moacir Gadotti, Pierre Bourdieu, Jean Piaget, John Dewey, José Eustáquio Romão, Michel Foucault, Paulo Freire, Rubem Alves, Rui Canário, Stephen Ball, Vygotsky, entre outrs.